28/03/2005

ser gente

Por muito que anseies
pelo porto de abrigo,
sabes que é ao largo do mar,
no centro da tempestade,
que atinges o teu tamanho.
Para além do medo do que é incerto
e do medo de não seres capaz,
estão as vagas vencidas pelo teimar,
está a rota por onde cresces,
em direcção ao norte,
a caminho do sol,
ou de ser gente.

27/03/2005

festa

Mão macia
longos dedos
carícia líquida
de ave. Arremedos
de potro
na teta esguia
recta oblíqua
de segredos
um beijo. Outro

beber do charco

Não queres beber senão água limpa,
não a há onde tu estás: embora.
Bebe mesmo do charco,
agonia-te, sim,mas mata a sede: tu
não podes morrer enquanto for de noite, enquanto
o mundo não for mais que filhos teus.

20/03/2005

voo

Voo
Voo diáfano e suave nas
curvas do vento morno
Nuvem branca
Voo na nuvem branca

no céu
Olhar
o ar, olhar
o infinito azul
Voar, isto é:
Voar mesmo e totalmente,
ser a nuvem, o vento, o voo.
Tudo.

flores

O seu riso
e as palavras,
era a elas
que cheiravam

maresia

Maresia nas areias
soltas
a amanhecer.
Ventania nas ideias
toscas
a reacender.
Acalmia pelas veias
loucas
a empurecer.
Maresia pelo dia
que por pouco
não nascia.

16/03/2005

redenção

Sobe, vai subindo,
até à luz;
deita a alma no corpo
lança o corpo na rocha,
arranha-te, esgota-te,
sobe a escarpa:
Sabes que há uma dor escondida
nas encostas do ser
que só pode sorrir
quando o suor e quando as lágrimas
enfim se confundirem.